domingo, 2 de novembro de 2008

Sobre o "novo" Campus José de Alencar

Carta ao Jornalista Fabio Campos, da Coluna POLITICA do Jornal O POVO.

"Caro Fabio Campos
Aceitando o chamamento ao debate do Arquiteto Romeu Duarte, que se coloca como Ex-Superintendente do IPHAN e atual consultor do projeto do novo Campus José de Alencar, quando de fato é um dos autores do mesmo juntamente com o Arquiteto Neudson Braga, ambos professores do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, faço aqui algumas colocações contrapostas.

Em nenhum programa de intervenção com este significado e dimensão que envolve alterar a configuração de um campus universitário central, plenamente inserido no contexto urbano do centro da cidade de Fortaleza e remover parte dos cursos, atividades e equipamentos de ensino ali existentes para situações periféricas, a discussão deveria começar pelo detalhe se os seus pressupostos estão equivocados. E não há boa solução de arquitetura que se justifique com pressupostos errados.

Em primeiro lugar, o que deve ser colocado na mesa de discussão são as atuais tendências de revalorização dos contextos históricos centrais das cidades, em todo o mundo, com o apoio das atividades e equipamentos de educação e cultura existentes versus uma modelagem comprovadamente obsoleta de criação de enclaves universitários periféricos, concebida no auge dos governos militares, por influencia do Acordo MEC/ USAID, há exatos 40 anos atrás, que trouxe como resultado às nossas cidades e a estes próprios equipamentos "relocalizados" muito mais problemas do que soluções e tornam quase impossíveis os roteiros de correção posteriores. Vide o caso imediato do Campus do PICI para o qual até hoje não se definiu um solução de inserção urbana adequada.

Em segundo lugar, a luz do argumento anterior, deveríamos ponderar se o modelo proposto é adequado. Guardadas as devidas proporções, esta "nova"(Ou antiga modelagem) adotada seria a mesma coisa que propor a retirada da Universidade da Sobornne do centro de Paris ou a Universidade de Havard do centro de Boston, ou a New York University, no "miolo" histórico de Manhanttan. Em Recife aqui do nosso lado, a UFPE/ Universidade Federal de Pernambuco resolveu se reinstalar no Bairro do Recife e consolidar o Porto Digital, que foi a mais forte ancora de requalificação urbana daquela situação - Projeto Recife Olinda - que hoje configura um projeto parceirizado por várias instâncias de governo e instituições nacionais e organismos de fomento e financiamento internacionais, como o BID e o BIRD.

Em nosso caso, uma terceira verificação ser feita em relação a questão do relevancia logística e a dinamica urbana de ambas as situações: o Campus do Benfica é hoje uma das mais qualificadas localizações de nossa cidade e Sítio Alagadiço Novo não consta ainda de nenhuma classificação. Na medida em que parte significativa da UFC "retira-se" da Avenida da Universidade, abre mão de estar em uma das mais destacadas posições de acessibilidade e mobilidade da Região Metropolitana de Fortaleza, vinculada a três dos mais importantes corredores de transporte - Av. 13 de Maio, Av. Carapinima/ José Bastos, esta com Metro em instalação e a própria Av. da Universidade – transtorna a vida de milhares de alunos, funcionários e usuários que utilizam-se do sistema de transporte municipal e intermunicipal ou habitam naquela região, compromete a própria dinâmica urbana daquele setor da cidade e sem qualquer lógica perceptível vai se instalar em uma posição de improvável desenvolvimento a curto prazo, na extensão da Av. Washington Soares, nos "cafundós" do Alagadiço Novo, sobre um sítio histórico tombado a nível federal pelo IPHAN, onde existem restrições a qualquer tipo de intervenção, por conta de sua importancia referencial.

Em quarto lugar e em sequencia, restam ainda outras questões a debater,o que será feito do patrimonio imobiliário da UFC na Av. da Universidade? E o restante dos equipamentos universitários ali existentes vão entrar em obsolescência, como o Restaurante Universitário, as Casas de Cultura e Línguas, Casa Amarela, Conservatório Alberto Nepomuceno, as Pró Reitorias e seus satélites, já que os demandantes dos mesmos vão se transferir? Se transferirão os equipamentos ligados ao Curso de Comunicação: Radio e TV Universitária, Imprensa Universitária? Como se deslocarão os milhares de alunos e matriculados para as imediações do Cambeba? Existe disponibilidade de moradia e serviços urbanos no Alagadiço Novo ou iremos criar um novo "Campus do PICI"? Porque a comunidade universitária não foi consultada previa e abertamente?

Por fim, ainda constestamos o fragil argumento utilizado para justificar a transferência de instalações, que é a carência de terreno para novas instalações, também não procede. O Campus do Benfica tem aproximadamente 14 hectares - 140.000 m² e potencial construtivo de 280.000 m² - e pode ser integralmente redesenhado de forma a transformar-se em uma ancora de requalificação urbana do Centro da Cidade, juntamente com o METROFOR.

Não podemos "continuar" a querer inventar a roda, a todo momento, ao convalidar as tendencias catastroficas de um urbanismo apressado, equivocado e autofágico baseada na destruição das situações referenciais centrais de nossa cidade. Depois desta só resta aparecer a proposição de querer levar a orla marítima central para as imediações da Av. Washington Soares.

Cordialmente
José Sales
Prof. Departamento de Arquitetura e Urbanismo UFC/ Arquiteto/ Urbanista"

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