A pouco mais de dois meses da 15a Conferência dos países signatários da Convenção sobre Mudanças Climáticas (CoP15 em dezembro, na capital da Dinamarca, Copenhague), ainda não se conhece as posições que o Brasil defenderá no evento.
Sabe-se que o Presidente Lula e o Itamaraty teriam admitido assumir metas para redução do desmatamento, mas é só. O Brasil é considerado peça chave nessa discussão e estimular um amplo debate sobre o principal assunto da agenda internacional é o mínimo que se poderia esperar diante de tamanha responsabilidade na busca de soluções para os problemas causados pelas mudanças do clima do planeta.
É inexplicável o silêncio do Brasil. Quarto maior emissor de gases do efeito estufa (GEE), o País é o único que reúne ao mesmo tempo condições políticas e técnicas para juntar China, Estados Unidos e Rússia – os maiores emissores - na busca de soluções.
Mesmo assim, abre mão de se projetar globalmente, liderando a superação de impasses que podem levar ao fracasso da conferência. A única forma de explicar tamanho desinteresse em tocar essa agenda talvez seja o perfil da economia brasileira, alicerçada sobre atividades fortemente indutoras das emissões de GEE. Até dezembro sai o inventário nacional de emissões de gases.
Como na edição anterior (2004), o inventário de 2009 será publicado às vésperas de uma CoP e chegará defasado, como a primeira (que foi lançada com dados referentes a 1994). Agora, serão registradas as emissões até 2005 e, mesmo assim, com os dados de desmatamento até 2002, o que vai excluir os volumes emitidos durante o boom econômico do triênio 2002-2004.
Porém, já se pode identificar algumas importantes fontes das emissões. A produção de commodities agrícolas, por exemplo, é a principal razão do desmatamento e das queimadas na região Amazônica, que respondem por mais de 70% dos GEE emitidos pelo Brasil.
Ali se manifesta a trágica miscigenação entre o público e o privado. É o caso dos maiores frigoríficos instalados na região. Embora recebam generosos financiamentos de um ente público, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), compram em larga escala gado criado em áreas oriundas de desmatamento.
Aliás, a articulação de interesses entre determinados agentes econômicos e o Estado é tão grande, e atinge tantos setores da economia, que, antes de definir estratégias para enfrentar o desmatamento e a emissão de gases, é necessário responder a questões cruciais.
Como derrubar a zero o desmatamento se o próprio Estado apóia, financia e viabiliza a queima da floresta? É possível imaginar essa redução sem alterar a nossa inserção na economia-mundo, que vê a Amazônia apenas como uma enorme plataforma de exportação de commodities? A recente descoberta de que o BNDES financia e participa do controle dos grandes frigoríficos que induzem ao desmatamento mostra um modus operandi que se repete em outras áreas.
Inclui-se aí o desmantelamento da regulação e da fiscalização de grandes projetos de infraestrutura e o sistemático aporte de enorme volume de recursos públicos em taxas subsidiadas, numa distribuição de financiamentos que transformam o Estado em financiador de última instância, sem o qual nenhum grande projeto se viabiliza.
Porém, ainda há outros dois grandes vetores da dizimação da floresta. O capital financeiro apóia projetos e controla empresas que administram volumes crescentes de recursos naturais e grandes esquemas de legalização de dinheiro buscam na região meios de fazer reservas de valor e de acumular recursos para incrementarem suas posições. Recentemente, até empresas do setor financeiro e de telefonia, tradicionalmente alheias à Amazônia, têm adquirido enormes porções de território para criar gado, plantar soja e extrair minérios a serem vendidos ao exterior sem agregação local de valor.
Nenhuma das opções políticas disponíveis aponta na direção no sentido de uma reforma radical no Estado e na aposta em outro modelo econômico que reduza a escala das emissões de GEE, o que deixa para a sociedade a atribuição de resolver mais esse problema monstruoso. Ou é assim ou nada se alterará.
Carlos Tautz é jornalista. Fonte Blog do Noblat.
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