Especialistas discutem a ocupação dos espaços públicos de Fortaleza por trabalhadores autônomos. O problema é do tempo da Idade Média. Os séculos IV a XV deram espaço para o comércio de excedentes e, dali em diante, especiarias e a última moda escoavam, oceanos afora, vindas das ruas do Oriente. E a Bíblia já testemunhava: o próprio Cristo condenou os vendalhões do templo, expulsando mercadores que se abancaram em pleno chão sagrado - a igreja, a propósito, era o ponto mais movimento de Jerusalém.
Mas as feiras continuaram, ao longo da história e das cidades. “O mercado informal não desaparece. A gente tem que aprender a conviver com ele”, sentencia Maria Clélia Lustosa Costa, professora do Departamento de Geografia da UFC e especialista em urbanização de Fortaleza. “O comércio de rua é histórico, os escravos já vendiam produtos na rua”, dialoga José Borzacchiello da Silva, pós-doutor em Geografia Humana. “E, na medida em que não há condições de emprego e renda para todos, há o comércio ambulante - também para a complementação da renda”, soma.
A ocupação das praças do Centro por feirantes puxa o fio da meada. Desde a última segunda-feira, oito fiscais da gerência administrativa do Centro (vinculada à Secretaria Executiva Regional II) percorrem o bairro em busca de um local para transferir, temporariamente, os ambulantes retirados da praça José de Alencar.
A expectativa é de que o novo endereço seja divulgado hoje. Urbanistas e geógrafos concordam em um ponto: o Centro deve continuar sendo o lugar desse comércio. Na opinião do professor Euler Muniz, coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Fortaleza (Unifor), essa atividade é um atrativo para repovoar o bairro. “Poderia aproveitar essa demanda (clientes) como oportunidade para fortalecer o Centro, que se transformou em um grande vazio”, relaciona. Mas contrapõe: são necessários locais apropriados. “A cidade vai se modificando e o planejamento tem que caminhar junto com a cidade”, diz, sugerindo o envolvimento de profissionais da área de Urbanismo no processo.
“Pensar uma ocupação racional do Centro” é o que defende o professor Eustógio Dantas, do Departamento de Geografia da UFC. Autor da dissertação “Comércio ambulante no Centro de Fortaleza (1975-1995)”, o estudioso indica o aluguel de galpões da área como “única possibilidade” de ordenamento do caos em que se transformaram as feiras das praças públicas. A organização desse comércio informal, completa Dantas, é só a primeira ação. “A Prefeitura não pode apagar fogueiras. Tem que ter um plano mais amplo”, ressalta.
A ausência de controle das ocupações do espaço público, observa José Bozarcchiello, mais a ineficiência de políticas de geração de emprego e renda são determinantes na ampliação do problema. Para Bozarcchiello, é importante “buscar o mínimo de formalização desse mercado para que o estado possa ter controle sobre ele”. Saber quem é quem na multidão de feirantes, coibir a mercadoria pirata e cobrar as devidas taxas são algumas sugestões dos especialistas para ordenar esse caos.
Reportagem de Ana Mary C. Cavalcanteda para o Jornal O POVO. Reprodução unicamente para divulgação. Direitos autorais preservados.
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